Para quem não tem medo de pensar...

sábado, 29 de maio de 2010

E se acordássemos?

Vivemos o cotidiano como se ele fosse a única resposta; quero dizer, vivemos, crescemos, reproduzimos e morremos como se este fosse o nosso único destino cerrado e derradeiro. A realidade nós é vista e passsada como um script pronto e acabado, sem intervenções, cortes ou superposições de imagens e vidas. Com o passar do tempo, percebemos pela rotina, causalidade e repetições de eventos que alguns fatos tendem a se repetir, até certos rostos e discursos, não nos soa estranho, é como se tívessemos visto outras vezes. Por caírmos nesse círculo vicioso de eventos em cadeia quase repetitivos nada nos acomodamos com nossa zona de conforto consciente, e assim, deste modo, ignoramos fatos, perguntas e questionamentos ficam no ar, interminavelmente abertos para que a geração seguinte tente responder.

É certo que determinadas questões são levantadas e respondidas conforme o background que cada contexto histórico permite fazê-lo, pois não poderíamos esperar que um jovem dos anos 60 respondesse à respeito da liberação das drogras igual à resposta de um jovem nascido no meio da revolução puritana inglesa; pois cada contexto histórico e social implicará nas influências que a vontade humana escolherá pra si. Logo percebo que não somos tão livres, a ponto de cultuar exacerbadamente a expressão liberdade. Mas é bem provável também que o limite entre a vontade genuína (aquela que não sofre interferências do meio) e a vontade "suja" (àquela que é viciada pelo meio)não seja tão fácil de determinarmos como pensamos. Por exemplo, até que ponto a sinfonia da composição de Vivaldi "Quatro estações" que agora estou escutando influenciará na forma e nas palavras dessa crônica? Até que ponto o consciente é tão poderoso a ponto de manter-se no controle?

Sinceramente não posso ter certeza da origem da minha vontade, segundo a razão, é bem provável que eu tenha faculdades inatas, mas não nasci programado para aprender tocar violão, piano, aprender outras línguas, me relacionar com determinadas pessoas - e essas respostas eu as conclui com um pequeno esforço da minha racionalidade.
Nessas linhas, percebo diante de tantas dúvidas e questões que, assim como Descartes eu tenho o direito de colocar tudo em dúvida. Por agora, a dúvida é minha grande certeza e infalível certeza - segundo a minha própria razão, obviamente.
Mas e se acordássemos? A sensação que teríamos seria à mesma daquela que temos quando acordamos no meio da noite perplexos, assustados e felizes (ou infelizes) por saber que tudo não passava de um sonho - uma ilusão. E se o cotidiano, a realidade nossa de cada dia não passe de uma fantasia? Como nas linhas do filme Matrix, de repente acordamos do sono profundo da razão diante de um mundo controlado por máquinas superavançadas e dominadoras?

Mas por quê temos tanto medo pelo desconhecido? Sim, por quê se tememos acordar da realidade como se fosse de um sonho é justamente porquê não conhecemos o que de fato seria a verdadeira realidade.


Por enquanto, ainda "deitado em berço esplêndido", talvez sim, talvez não; se na realidade ou no sonho, me permito relaxar com a mansidão e a leveza dos violinos comportados de Vivaldi.

Um comentário:

Guilherme disse...

O medo do desconhecido, a incerteza com relação ao futuro, a busca pelo conhecimento e o questionamento constante sobre todas as coisas fazem do ser humano o que ele é. Frágil, inseguro e imperfeito. Ou seja, humano. Grande texto, otima reflexão!