Para quem não tem medo de pensar...

sexta-feira, 8 de maio de 2009

Comida na cabeça !!!

Comida e leitura.

“É verdade que para praticar a leitura como arte, é necessário, antes de qualquer coisa, possuir uma faculdade hoje muito esquecida, uma faculdade que exige qualidades bovinas e não as de um homem moderno, ou seja, a ruminação”.
O filósofo do combate, Nietzsche, diz que para sermos artistas da leitura é necessários nos tornarmos semelhantes aos bois e vacas, pelo menos em uma linguagem metafórica, devemos assim como esses animais em suas refeições demoradas e demasiadamente longas nos esquecer do tempo dos relógios e nos deixar levar pela atenção longa e acurada daquilo que nos alimentamos. Mas, um pouco mais do que isso, penso que assim como os bois e vacas que para melhor aproveitarem as ricas substâncias dos seus alimentos nós devemos desenvolver a arte da ruminação intelectual, como se fôssemos seres antropofágicos.
Desenvolver a arte da leitura nada mais é que aprender a comer a carne do outrem. É sentar-se à mesa e servir-se do sangue e da carne do próprio escritor. E por isso que nós leitores e também escritores (pelos menos os escritores amadores como eu), após uma refeição de letras ora nos sentimos satisfeitos como se tivéssemos nos alimentados de um manjar dos deuses, e ora nos sentimos com o estômago indisposto como se a comida não tivesse “caído bem”.

Comida e leitura são rituais antropofágicos muito semelhantes, pelo menos aqui dentro da licença poética. Alimentamo-nos porque nosso corpo é movido à base das substâncias químicas que tais alimentos suportam. Lemos por que a nossa mente assim como o resto do corpo também precisa de substâncias que somente podem ser encontradas nos livros, nas poesias, nos textos, enfim, nas letras. É nesse sentido então que compreendo Rubem Alves, Antropofagia é nos tornar iguais. Antropofagia é eucaristia.

Mas é verdade também que alguns parecem que nasceram com o “estômago da cabeça” atrofiado e sem uso. Não sabem ou não foram iniciados nos prazeres proporcionados pela leitura, por esse ritual eucarístico da mente. Sentem-se sempre satisfeitos e de “estômago” cheio. É incrível como esses seres sobrevivem. Somos comensais, nascemos com os sentidos voltados para a satisfação de nossas carências alimentares. Seres vivos comem para sobreviver. Mas para alguns, o rico processo de digestão intelectual não passa de uma refeição forçosamente desprazerosa. Para esses a refeição intelectual não se trata de uma ritual sagrado e cheio de variadas experiências sensíveis.

Nesse caso, alguns indagariam como então esses avessos aos rituais antropofágicos intelectual da leitura sobrevivem?Como se alimentam suas mentes então? Simplesmente esses afortunados vivem das delícias rápidas, fáceis e práticas dos fast-food, àquelas comidas industrializadas pela necessidade de tempo e praticidade. É disso que esses seres se alimentam. Sobre uma perspectiva metafórica preferem o MC Lanche feliz ao arroz com feijão servido com verduras, legumes e bife. Preferem os modificados geneticamente até dos que os organicamente corretos. Não interprete mal caro leitor, não estou impondo o meu gosto como regra e lei. Apenas estou justificando racionalmente porque determinadas pessoas sobrevivem e que não tiveram o prazer de sentar-se diante de um bom livro comestível à mente e se alimentar dele. Maravilhas da adaptação evolutiva da espécie, alguns diriam. Pode ser que seja isso mesmo. De qualquer modo, comida e leitura são rituais de seres biologicamente insatisfeitos como nós.

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