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quinta-feira, 28 de maio de 2009

"bárbaro" é tudo aquilo que não fazemos em nossa casa...



Quando voltamos a terra natal em tempos de férias, no interior, nos reencontramos com algumas peculiaridades que esquecemos durante os tempos que passamos distante de nossas origens.
Dentre essas peculiaridades, as mais interessantes para mim dizem respeito às palavras, expressões, enfim, diz respeito à linguagem própria a característica do local. Porque a linguagem é uma ferramenta humana bem flexível e variada; e a linguagem também diz muito sobre a visão ou ethos de um povo. Pois bem, na minha região quando um garoto ganha um presente, ou leva a melhor nas trocas com outros garotos usamos a expressão “malei”. Por exemplo, Joãozinho ganha no jogo de bolas de gude 10 bolinhas do seu adversário, e para expressar sua alegria e satisfação ele diz “malei, ganhei 10 bolinhas de gude”.
Caro leitor, não me pergunte sobre a origem dessa expressão porque ela parece ser mais velha que o meu avô que já possui 86 anos, e que inclusive tem memórias dos fatos pioneiros da minha cidade. Mas voltando a expressão “malei” parece que o seu uso denota expressão do tipo satisfação, artimanha, enfim, habilidades capitalísticas. Mas há um detalhe, o uso da expressão “malei” só era permitida pelos mais jovens, parece que os mais velhos também desenvolveram um tipo de palavra própria da experiência deles para significar satisfação, porque jovens e velhos criam abismos também em suas formas de comunicação.

Sem falar das palavras que só tenho conhecimento de uso dentro dos limites da minha cidade, Águas Formosas, quando volto para cá não perco a oportunidade de me deleitar com o sotaque misturado, entre um baiano cantado e preguiçoso (nada contras os baianos, claro) e um mineiro bem calado e enrustido, como é próprio da mineiridade.
Presto muito atenção nas formas como as pessoas falam e usam as palavras, por que, de fato, palavras carregam em si mais do que meras informações, elas falam da estrutura de pensamento e obviamente das personalidades dessas pessoas.

Pensando nessas palavras, me lembro de uma história interessante. Desde cedo percebi minha vocação para o estudo da linguagem e da formação dos vocábulos quando me deparei com um nome um tanto esquisito para uma espécie de pernilongo aqui chamado de “muriçoca”. Aliás, nem sei ao menos se é desta forma que se escreve, mas àquele inseto também nem sabia como se escrevia o seu nome. De qualquer modo me intrigava como as pessoas chamavam o danado do bicho. Foi então que logo resolvi seguir os conselhos dos professores, procurei um dicionário da língua portuguesa, porque afinal de contas, logo quando iniciamos na aventura da linguagem aprendemos com algumas pessoas que o dicionário é um livro sagrado onde se registra todas as palavras possíveis de uma determinada língua e o respectivo significados de seus usos. Para minha decepção não encontrei esse pseudonome para o pernilongo.
E hoje para minha alegria descobri os dicionários não esgotam a criatividade humana de dar e receber nomes.
Você meu caro leitor, talvez tenha pensado da seguinte maneira: “mas que costume de Bárbaros, como pode aquele inseto denominado pernilongo receber tal nome?” Pois bem amigos, conforme já dizia Montaigne no século XVI “na verdade, cada qual considera bárbaro o que não se pratica em sua terra”. Palavras são meros objetos da ação humana de dar nomes. Posso concordar que a expressão muriçoca soe meio esquisita, mas é óbvio, soa esquisita porque não se pratica em todo lugar.

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